Não vote, politize-se!
Por uma política viva e comunitário e não a uma política de rebanho!
A política representativa evidenciou tanto o seu fracasso. A concorrida por votos nos tornou estúpidos, cegos e torcedores políticos. As ofensas correm de um lado ao outro e a verdade é que nos tornamos todos rebanhos, gado mesmo, chifrando de direita ou de esquerda, mas nunca deixamos é de bater cabeça. Criamos as olimpíadas do voto a cada dois anos e que vença o mais cara de pau!
Para muita gente a política do ‘não voto’ pode parecer uma negação da política, mas ela é justamente o contrário, é o voto que esvazia o sentido da política e a transforma no jogo da expertise. Todos sabem que nessa corrida para a vitória o que importa não é a política mesmo, mas o que levará ao convencimento das pessoas. Neste caso, ganha não “o melhor” mas a “melhor lábia”.
Não é atoa que político tem fama de mentiroso, mas por que ainda insistimos neles e gastamos nossas energias nesse engodo que é a política representativa?
Durante o ano os partidos, jornais e afins promovem diversas pesquisas de opinião para saber o que a população espera de um político nas próximas eleições. Eles querem saber exatamente aquilo que te motiva, te emociona e te convence! É baseado nessas pesquisas que os partidos vão escolher os seus candidatos e preparar seus discursos e “propagandas”. O político hoje é como qualquer outro produto, ele precisa de uma propaganda para te convencer a consumi-lo e para isso, ele vai se preocupar em dizer o que você quer ouvir, o que te comove e emociona e não o que é importante para a sociedade.
Por exemplo, se hoje muita gente está preocupada com questões raciais e de gênero, os partidos vão apresentar mais candidatos negros, indígenas, mulheres e LGBTs. Mas se também há um outro grupo mais conservador, então vão apresentar opções ligadas aos setores religiosos, militares etc. O mesmo vale para as expectativas da população: se ela está mais preocupada com segurança, esse assunto vai estar nas principais promessas; se as pessoas estão procurando um político que pareça um “herói” que vai “salvar a nação” de qualquer coisa, vão nos apresentar políticos que usem um discurso de salvação, se colocando como um messias ou como alguém que não se “corrompe”. Por outro lado, também tem aqueles que buscam um político que pareça simples, do povo e tal, aí ele vai fazer seu “marketing” lanchando na barraquinha de pastel, abraçando pessoas mais humildes, mostrando seu cotidiano e até seu “carro popular”. Talvez você queira um político que se pareça com você, que tenha seu tom de pele, sua identidade de gênero, viva parecido com você etc., fique tranquilo! No mercado eleitoral, tem para todos os gostos, desejos e ilusões!
Nada disso precisa ser sincero ou real. Como falou Maquiavel, o importante é “parecer” e não ser e, o político, não precisa se preocupar em cumprir suas promessas, mas apenas em fazer você acreditar nele. O marketing dessa política está empenhada mais em produzir sentimentos na população do que em debater propostas. O político tem que te emocionar, tem que te fazer sentir fazendo o certo, o bem, o melhor. Tem que te fazer sentir lutando em nome de Deus, da pátria ou mesmo dos mais pobres, das minorias etc. A política é um jogo de desejos, cada vez mais distante de qualquer racionalidade e, parece ainda, que o que sobrou de racional nela foi destinada às fake news.
Por isso a política do voto é a política do esvaziamento. Ela desvia completamente o sentido real de ser e fazer política. O primeiro erro é a invenção do político profissional, aquele que vive para ganhar votos e ser uma figura pública: é aquele que a gente chama de “político”. Tudo isso é um erro porque na política real, em uma democracia real, os políticos somos todas e todos nós! Aristóteles dizia que o que nos diferencia dos outros animais é que nós somos “seres políticos”, então, em uma sociedade onde a população está separada da política e é despolitizada, ela se assemelha a um “gado”, seja esse gado de direito ou de esquerda!
A diferença entre ser um animal ou um ser humano é justamente a nossa capacidade de decidir sobre as nossas vidas de uma forma coletiva, pública. É a nossa capacidade de dialogar, pensar e executar as soluções para o bairro e cidade em que vivemos. Mas a política da competição pelo voto nos individualiza e nos desassocia enquanto comunidade, ela tira do campo do pensar e executar comunitariamente para o cada um por si. Cada um vai pensar e decidir em qual número apertar na urna baseado em desejos e aspirações individuais. Dessa forma deixamos de ser “seres políticos” para nos tornarmos “gado”!
E aí entra outro ponto que não podemos esquecer, se “a união faz a força” - e democracia real é a união das forças individuais para se pensar o comum, o público – a desunião nos enfraquece e é aí que nos desinteressamos mais ainda pela política real e caímos no jogo da politicagem eleitoral, nos embriagamos nessas disputas e brigas que desune, separa e individualiza cada vez mais. Nos tornamos hostis com nossos familiares, vizinhos, amigos e brigamos mesmo. Ficamos intolerantes e “cancelamos” essas pessoas de todo o diálogo e nos fechamos cada vez mais em nossas bolhas. É aí que as redes sociais viram o campo minado do deboche, ironia e sarcasmos, com todo mundo “dando um recado” implícito; muito se falando e pouca compreensão do outro. Nos fechamos para mudar e sermos mudados de verdade.
Uma outra campanha se faz necessária, uma outra política e democracia. O “não vote!” como política é uma luta por politização, por humanização de nós mesmos. É uma luta contra essa política de rebanho onde partidos e “políticos profissionais” inventam discursos e propagandas para seduzir e guiar. Nós precisamos deixar de ser rebanho para sermos mais humanos, seres políticos capazes de dialogar e de decidir as próprias vidas.
Enquanto vivermos esse esvaziamento da política não haverá democracia e as elites financeiras continuarão elegendo os seus representantes, pois recursos eles têm de sobra para investir em propaganda, pesquisas e até mesmo em “fake news”, dizendo aquilo que a gente gosta de ouvir e não o que realmente pensam e pretendem.
Fazer política e democracia real é decidir e executar comunitariamente sobre as necessidades de onde vivemos, com as pessoas onde vivemos: comunidade, bairro, cidade. Começamos a fazer política nos unindo, organizando e debatendo com aquelas e aqueles que compartilham os mesmos territórios que os nossos. É assim que a história popular sempre caminhou. Só vamos acabar com todos os fundamentalismos e intolerâncias quando trouxemos a política para a realidade cotidiana e abandonarmos a crença de que um outro alguém que vai nos salvar ou resolver todos os problemas.
Não vote! Organize-se na sua comunidade!